segunda-feira, 23 de maio de 2011

Outono Carioca


Ipanema - maio-2011

                                                                                    


                                                        Vista cansada
Acho que foi o Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua volta como se a visse pela última vez. Pela última ou pela primeira vez? Pela primeira vez foi outro escritor quem disse. Essa ideia de olhar pela última vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a vida continua, não admira que o Hemingway tenha acabado como acabou.
Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não vendo. Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa rotina é como um vazio.
Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver, você não vê. Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo hall do prédio do seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.
Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a mínima ideia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer. Se
um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o rito, pode ser também que ninguém desse por sua ausência. O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos.
Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia a dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.

RESENDE, Otto Lara. Disponível em: http://www.releituras.com/olresende_vista.asp
Acesso em: 21 dez. 2010. (Adaptado)


sábado, 7 de maio de 2011

Pendurando novas ideias no varal


                                     Universidade e Formação Individual
A universidade e a formação individual são, atualmente, dois conceitos que se distanciam cada vez mais. Originalmente, a primeira é uma conseqüência desta, ou melhor, da busca por formação. Os aficionados pelo saber procuravam mestres que julgassem capazes de orientá-los até quando estivessem prontos para falar em público. Assim nasceu a universidade. Passados alguns séculos, essa tradição se perdeu completamente.

Hoje, o ensino superior apenas concede “licenças” que permitem ao aluno o ingresso no mercado de trabalho. A universidade oferece um programa a ser cumprido. Há um grupo de disciplinas que deverá ser estudado durante determinado tempo e cujo objetivo é uma pontuação mínima. TAC modelo pode contribuir muito para a formação profissional, mas só acidentalmente contribuirá para uma verdadeira formação individual. A demanda atual é por diplomas e não por conhecimento.

Aquele que deseja obter uma formação superior verdadeira deve fazer algo parecido com o que os antigos filósofos escolásticos fizeram: buscar seus mestres e recorrer ao autodidatismo. E deve fazê-lo sem a expectativa de reconhecimento, vantagens ou crescimento profissional. Tudo isso poderá acontecer também de forma acidental, mas jamais como finalidade. Como disse o escritor americano Mark Twain a seu filho: “Não me oponho que você entre para a universidade, mas não deixe isso atrapalhar seus estudos”.


A inspiração para o texto veio de uma palestra do professor José Monir Nasser, quando do lançamento de um livro que trata de educação clássica. Ela pode ser vista através desse link:

http://www.erealizacoes.com.br/espaco/janelaVideo.php?video=Lanc_OTrivium&posicao=2

abs,
Ilton Nogueira